11/25/2008

FLOGISTO

INTRODUÇÃO
Embora hoje saibamos que calor é energia, será que foi sempre assim? Certamente que não, a noção de calor existe desde há muito, desde o primeiro homem que se encostou a uma rocha, virado para o sol aquecia-se, mais tarde surgiu o fogo com todas as suas "peripécias", nomeadamente a de aquecer. É de salientar ainda o aquecimento próprio, também alcançado com trabalho físico que como é evidente veio criar a analogia entre trabalho e calor. Devido às combustões e com os problemas inerentes à sua interpretação, nomeadamente o facto duma chama se extinguir na ausência de ar, surge uma das primeiras teorias de calor - FLOGISTO A teoria do FLOGISTO apareceu com Stahl, e foram químicos como Priestley e Cavendish que tiveram influência decisiva na sua implantação no séc. XVIII. A denominação de FLOGISTO deve-se a Stahl e está directamente relacionado com a combustão sendo o seu processo semelhante ao da respiração e da calcinação, foi de grande importância no quotidiano nomeadamente no que diz respeito à metalurgia. Os grandes problemas inerentes à teoria flogística relacionavam-se com o facto de não se saber qual a importância do ar na combustão nem como se poderia processar a calcinação. Foi com as experiências de Boyle e mais tarde com as de Lavoisier que tais dúvidas começariam a ser dissipadas, vindo então a saber-se qual o princípio vital da combustão bem como o da calcinação.
A partir do século XVII e até cerca do século XIX podia-se ler nos tratados de física "o que se chama vulgarmente fogo não é mais que um corpo em brasa ........... é um fluido ao qual se tem dado sucessivamente os nomes de princípio inflamável, princípio do calor, matéria do calor e que os modernos chamam calórico". Isto advinha de que os antigos se limitavam a aproveitar as manifestações do fogo sem aprofundar as suas causas em fenómenos como a ebulição, a fusão, etc.. Até Aristóteles escreveu : "o calor não é constituído por movimento mas produzido pelo éter, excitado pelo sol ou as estrelas". Galileu, também ele assumiu esta ideia de Aristóteles a que se veio juntar, mais tarde, Newton. Para aumentar a confusão Kepler ( contemporâneo de Galileu ) defendia a ideia de Roger Bacon (1214-1294 ) de que o calor tem a sua origem nos movimentos das partículas internas dos corpos. Só em 1783, com as criticas de Lavoisier e Laplace é que esta ideia de calórico como fluido material começou a ser contestada, embora mesmo assim esta noção perdurasse até meados do século XIX. Em 1842 Julius Robert Mayer ( 1814-1878 ) deu um dos primeiros grandes passos no sentido de uma correcta descrição do "calor", embora não se deva esquecer o contributo de Sadi Carnot ( 1796-1832 ), pois este deixou as bases não apenas do segundo princípio da termodinâmica mas também algumas luzes para a construção do primeiro princípio. Convém salientar o facto de que foi J. Black quem descobriu a noção de calor latente (1761) e quem mostrou a necessidade de distinção entre temperatura e calor. A Lavoisier deve-se a noção correcta de calor específico e de ser o primeiro constructor do calorímetro. (ver anexo 4 e 5 ) No que respeita à construção e utilização dos primeiros termómetros convém salientar as dificuldades que surgiram principalmente no que toca à definição das escalas termométricas. Sabe-se que o primeiro termómetro clínico deve-se a um médico da universidade de Pádua, em 1612, embora o termo termómetro só apareça pela primeira vez em 1624 com Leurechon ( 1593-1670 ). A partir daqui muitos físicos interessaram-se pelo aperfeiçoamento do termómetro, de entre os quais Fahrenheit ( 1686-1736 ) que dedicou toda a sua vida à construção destes aparelhos. Em meados do século XVII fez-se sentir a necessidade de utilização de escalas termométricas e em 1694 surge Renaldini ( 1615-1698 ) que escolheu como pontos fixos dum termómetro a fusão do gelo e a ebulição da água. A partir de 1717 Fahrenheit constrói diversos termómetros e chega à conclusão que deve assentar no valor 32 para a fusão do gelo e no valor 96 que era a temperatura do sangue humano. Foi Celcius ( 1701-1744 ) quem construiu o termómetro com a escala centígrada, ou seja, 0 para a fusão do gelo e 100 para a ebulição da água. Com o termómetro surgiu a seguinte questão: - como pode ele medir a temperatura de outro corpo se cada termómetro nada mais pode medir que a sua própria temperatura? A resposta a esta questão assenta no seguinte princípio da termodinâmica: - Num recinto isolado, dois ou mais corpos postos em contacto, trocam entre si calor até se encontrarem à mesma temperatura.

O CALÓRICO E O PRIMEIRO PRINCÍPIO
Foi por volta de fins do século XVIII que em França se começou a utilizar a palavra calórico como significando a matéria do calor . Os físicos nesta altura estavam divididos quanto à natureza do calor, uns diziam tratar-se de um fluido que penetra nos corpos conforme a sua temperatura, outros pensam que o calor não é mais que o resultado dos movimentos insensíveis das moléculas da matéria. Deve-se a RUMFORD e também a Robert Mayer( ver anexo 6 ) o passo em frente no esclarecimento desta confusão, pois para além de terem adiantado a hipótese da equivalência entre calor e trabalho, acabaram por implantar a equivalência entre calor e energia. Com o desenvolvimento destas ideias de trabalho e de energia surgiu com ele ( princípios do século XIX ) a noção da conservação de energia total mecânica de um sistema isolado que aliado à ideia de conservação de massa ( Lavoisier ) veio pôr por terra a noção de calórico. Pois, se o calórico era material, o aquecimento da água tinha de resultar da transformação de qualquer matéria, mas nada se encontrava que justificasse o enorme calor desenvolvido. Então, se o calórico não era matéria, é porque era uma "virtude" como a electricidade e a luz. Esta incerteza dissipou-se parcialmente em 1842 com J. P. Joule ( ver anexo 11 ) que devido às suas experiências na produção de calor pela corrente eléctrica chegou à conclusão que o calor libertado pela passagem desta corrente eléctrica num fio é proporcional à resistência do condutor, ao quadrado da intensidade da corrente e ao tempo durante o qual esta passa no condutor. Não foi de admirar que mais tarde com o próprio Joule (ver anexo 12) e com Mayer se conseguisse chegar à já falada equivalência entre calor e energia ou calor e trabalho, na medida em que energia anda associada a trabalho. ( W = JQ W*trabalho; Q *quantidade de calor, J*equivalente mecânico; 1J = erg ). Contudo deve-se a Hirn ( 1815-1890 ) a divulgação do termo caloria para a unidade de calor, embora este conceito e sua definição fosse da responsabilidade de Dulong ( 1838 ). Com isto Mayer enunciou o princípio da conservação da energia : quando uma quantidade de energia de qualquer natureza desaparece numa transformação então produz-se uma quantidade igual em grandeza duma energia de outra natureza.

TEORIA DO FLOGISTO
Como já vimos Lavoisier considerava o fogo uma substância simples dando-lhe o nome de "calórico". Joseph Priestley e Henry Cavendish usariam o termo FLOGÍSTICO. Foi somente, com o desenvolvimento da TERMODINÂMICA no séc. XIX, que os químicos foram capazes de ajustar o fogo a uma teoria numa base satisfatória.. Anne Robert Jacques Turgot (1721-81) reconheceu as implicações das experiências efectuadas na evaporação. Através das experiências do Abbé Nollet e de Wallerius àcerca da evaporação no vácuo, Turgot concluiu que a dilatação era uma propriedade não só do ar mas também de todas as substâncias no estado de vapor. Joseph Priestley, o mais bem sucedido investigador do "ar", coleccionou os seus ares sobre mercúrio numa versão improvisada através de um pneumático ( ver anexo 3 ). Começando com o estudo do ar fixo, ele obteve uma variedade de gases de diferentes maneiras e mostrou que a sua solubilidade em água aumentava com a pressão. Em Junho de 1772 publicou um panfleto intitulado"Instruções para saturar água com ar fixo". A sua acção foi importante para o triunfo da TEORIA DO FLOGISTO, mas foi também nessa época que Lavoisier viria a tornar-se um dos seus mais sérios opositores.
O PROBLEMA DA COMBUSTÃO Em 1660 Robert Boyle divulgou consideráveis experiências que tinha realizado com a sua bomba pneumática. A bomba pneumática era obviamente vantajosa na investigação do papel do ar na combustão. As suas experiências indicaram-lhe que alguma substância vital do ar era necessária para sustentar a chama e a vida. Também descobriu que a calcinação requer a presença da atmosfera e que o resíduo metálico pesa mais do que o metal donde foi produzido. Todas as suas experiências indicam que combustão, respiração e calcinação são processos similares e que usam acima do ar algum princípio vital pertencente ao ar. O esforço de Boyle para medir a quantidade de ar perdido foi mal sucedido. Tentou medir o ar perdido a partir da pressão num recipiente de ar contendo um rato. O rato morreu, mas a pressão continuou a mesma. Em 1674, John Mayow (1641-79) efectuou a mesma experiência num recipiente sobre a água e mediu a perda de ar quando um rato o respirava ou quando uma vela consumia o ar queimando-o. Nas experiências de Mayow o gás carbónico produzido por combustão e respiração dissolveu-se na água, ao passo que nas experiências de Boyle, isso não acontecia. Contudo, existia uma substância que se desconhecia a sua acção em presença do ar, é a nossa conhecida pólvora. Robert Hooke (1635-1702) na sua "Micrographia" de 1655 e Mayow no seu "Tractatus quinque" de 1674 ambos concluíram que era o salitre, ou nitrato de potássio, o qual se encontrava dentro da pólvora, que fornecia o princípio vital necessário à combustão. O enxofre e o carvão, os outros ingredientes da pólvora, consumiam-se no ar mas não por si mesmos no vácuo. Assim, deveria ser uma substância comum ao nitrato de potássio e ao ar que sustentava a combustão. Mayow chamou-lhe espírito (aéreo) de nitro ou partículas de ar nitroso. Hooke considerou uma teoria muito semelhante. Reivindicou que o fogo era a "dissolução de corpos queimados pelo maior dissolvente universal de todas as substâncias sulfurosas, nomeadamente o ar". Esta era uma velha ideia proveniente da alquimia e que se descobriu na tardia idade madura, mas com as investigações experimentais de Boyle, Hooke e Mayow adquiriram uma notável precisão científica e enorme respeitabilidade.
A TEORIA FLOGÍSTICA
Na Alemanha, a química tinha fechado sociedade com a exploração mineira e a fundição de minério, daí resultou uma teoria competitiva que deu um maior esclarecimento sobre a combustão. Johann Joachim Becher (1635-82) na sua "Physica subterrânea" (1669), reconheceu diferentes tipos de terra. De acordo com a sua teoria, os corpos combustíveis contêm terra gordurosa que era libertada durante a combustão, deixando ao solo um aspecto duro. Georg Stahl estendeu grandemente a teoria de Becher no seu "Specimen beccherianum" de 1703. Deu novo nome à terra gordurosa -o FLOGISTO. De acordo com a teoria do flogisto, a principal combustão realizava-se de preferência no combustível do que no ar. Quando o carvão é consumido pelo fogo, liberta-se o flogisto, deixando apenas poucas cinzas. Por isso, o carvão deve ser muito rico em flogisto. A respiração expele o flogisto, como a calcinação. Os resíduos metálicos podem regressar ao estado metálico, fornecendo-lhes calor conjuntamente com o carvão, pois como temos vindo a ver, o carvão é uma fonte muito rica em flogisto, o qual é absorvido pelos resíduos por forma a produzir o metal. Quando Stahl perguntou a um trabalhador da fundição qual era a função do carvão na passagem da redução de resíduo ao metal, ele disse-lhe que o resíduo metálico no carvão oculta nele mesmo a capacidade de fuga ao calor do fogo. Ao observar a acção do carvão quando queimado temos que: os resíduos metálicos dentro do forno de fundição deixam cair pequenos fragmentos de carvão para cima dos próprios resíduos. Onde quer que o carvão caia, uma pequena quantidade tornar-se-à visível. Parece ser evidente que o carvão inclui algum ingrediente que é absorvido pelos resíduos originando a criação do metal. Por consequência, todos os metais contêm flogisto, o qual explica as propriedades comuns de densidade, brilho e maleabilidade. Combustão, calcinação e respiração param quando o ar é saturado e envenenado pelo flogisto. O ar é essencial. Actua como uma esponja absorvendo o flogisto, mas por vezes é poluido pelo flogisto e perde a sua elasticidade não suportando por muito tempo a combustão. Boyle verifica que o resíduo metálico (sem flogisto) pesa mais do que o metal (o qual contém flogisto) donde ele é originado. Poderia o flogisto pesar menos do que o nada ? Aristóteles supôs que os elementos do fogo respeitavam o princípio da leveza, enquanto Cavendish falava do ar inflamável (hidrogénio), pensando que pela maneira como o ar era queimado poderia ser um flogisto puro, sendo menos denso do que o ar comum, mas o conceito de peso negativo não era uma noção muito atractiva no séc.XVIII. Tranquilamente, o flogisto impôs-se como fenómeno oferecendo garantias de boa qualidade, vindo posteriormente a ser um valoroso instrumento teórico. Stahl foi um dos principais químicos da sua época,(séc. XVIII), possuidor de um poder distinto, mas viria a cometer um erro ao assumir que a teoria do flogisto era pautada pela química com incontestada autoridade, por um longo tempo. Os mais populares manuais em França durante a primeira metade do séc.XVIII pertenciam a Boerhaave e Nicolas Lemery. Nem um nem outro mencionavam o flogisto. Mas cerca de 1750 a crescente procura da indústria , especialmente na metalurgia, causou grande atenção nos textos alemães de química, muito dos quais foram traduzidos para francês entre 1750 e 1760. Em 1756, uma versão editada por Lemery "Cours de chimie" (1675) apareceu com um comentário sobre flogística. Em, 1757, J. F. Demachy (1728-1803) traduziu o livro de Johann Juncker (1679-1759) "Conspectus of chemistry" (1730) e publicou-o com outro título - "Elements of chemistry according to the principles of Becher and Stahl". Baron d'Holback, foi o responsável por artigos de minerologia e metalurgia na Enciclopédia, foi um defensor da teoria do flogisto, e em 1766 traduziu "Zufällige Gedancken ... über den Streit von den sogenannten Sulphure" livro de Stahl, provavelmente com a exposição mais clara da teoria. O mais importante químico alemão foi Andreas Sigismund Marggraf (1709-82), cujos escritos nas Memórias da Academia de Berlim durante 1740 e 1750 mereceram a admiração dos químicos franceses. A afluência de textos de origem alemã coincidiu com o renascimento da química francesa pela mão de Guillaume-François Rouelle (1703-70), que começou as suas famosas leituras de química no Jardim do REI em 1742. Os principais químicos franceses estudaram com Rouelle, o qual lentamente atraiu a atenção dos químicos alemães adoptando uma modificação no modelo da teoria flogística. Quando Lavoisier começou a fazer experiências sobre combustão em 1772, estando sempre atento às conferências de Rouelle, a teoria do flogisto desfrutou de uma popularidade geral em França e em Inglaterra aproximadamente durante 20 anos.
EXPERIÊNCIAS DE LAVOISIER SOBRE COMBUSTÃO
Existem poucas actividades de Lavoisier antecedentes a 1772 que revelem algum interesse na combustão. Estudou no Colégio das Quatro Nações, o qual lhe deu a melhor preparação científica, vindo mais tarde, e no prosseguimento dos seus estudos, a estudar astronomia com o seu primeiro professor Abbé Nicolas-Louis de Lacaille (1713-62) e acompanhou o seu professor de botânica Bernard de Jussieu (1699-1777) numa excursão a várias regiões de Paris. Desde 1763, que Lavoisier começou a ajudar o geólogo Jean-Etienne Guettard (1715-86) no atlas geológico. Admitido na academia em 1768, rapidamente se viu envolvido numa questão prática e que estava relacionada com o melhoramento da água que abastecia Paris. Já desde os estudos de geologia com Guettard que se interessava pela origem mineral, e os debates na academia sobre testes de pureza da água levaram-no a investigar a antiga ideia de que quando a água se evapora uma pequena parte dela é absorvida pela terra. O método que Lavoisier usou nas análises de água caracterizou-se no facto das suas subsequentes investigações científicas serem bastante cuidadosas. Usando um laboratório técnico, deitou a mão a problemas práticos, sempre com o olho na teoria (ver anexo 2 ). Foi o grande responsável pela superioridade francesa durante a Revolução Francesa e Guerra Napoleónica devido à constante utilização da "sua" pólvora, e esforçou-se na reforma do sistema de pesos e medidas.
No Verão de 1772, começou a pensar nos problemas anteriores relacionados com o "ar" chegando à mesma conclusão teórica de Turgot, a qual falava sobre o estado de vapor da matéria. Duas outras academias nas suas ocupações diárias trouxeram o problema da combustão à atenção de Lavoisier. A primeira está relacionada com a destruição de diamantes. Já há muito tempo se sabia que o diamante, mineral mais duro até então conhecido, poderia ser destruído pelo calor, mas não havia certeza se o diamante era consumido pelo fogo ou se evaporava na caldeira. Lavoisier, conjuntamente com químicos Pierre-Joseph Macquer (1718-84), Louis-Claude Cadet (1731-99) e Mathurin-Jacques Brisson (1723-1806) realizaram experiências com diamantes a elevadas temperaturas. Esta temperatura foi obtida através de uma grande lente de inflamação da Academia de Ciências. Estas experiências serviram para verificar que os diamantes queimavam-se no ar mas nunca se evaporam. Entretanto uma segunda academia também inclinou-se para os trabalhos de Lavoisier. Ao analisar um papel sobre o fósforo, o farmacêutico Pierre-Francois Mitouard verificou que quando queimado o fósforo aumentava de peso, sugerindo que tal facto tinha alguma coisa a haver com o ar. Lavoisier tinha decidido concluir as suas experiências, e chegou até Mitouard por forma a obter o fósforo. Em Setembro de 1772, começou a realizar experiências sobre calcinação de metais. Na Primavera desse ano a academia publica o livro de Louis-Bernard Guyton de Morveau ( 1737-1816 ) " Digressions Académiques " que contém a primeira demonstração clara de que todos os metais ganham peso na calcinação, vindo a ser um ponto de vista muito discutido pelo facto de que a teoria do flogisto não conseguia explicar facilmente tal ocorrência, na medida em que dava a sensação que a perda de flogisto produzia um aumento de peso, não em circunstâncias pouco usuais mas em qualquer instante da calcinação de metais. Nunca se saberá exactamente que associação de ideias e as circunstâncias que levaram Lavoisier a empreender um estudo sobre a combustão, mas está claro que a disposição das peças do puzzle falam todas dele. Os conhecimentos que provavelmente contribuíram para a sua inspiração foram : 1. levar em linha de consideração o papel do ar na combustão do diamante 2. o entendimento do aumento de peso provocado pela combustão do fósforo e da calcinação de metais 3. a possibilidade de utilização de alguma informação imprecisa e incompleta acerca do trabalho sobre pneumática de químicos ingleses 4. a familiaridade de Lavoisier com a teoria de Turgot do estado de vapor da matéria no qual todos os factos experimentais viriam a ser naturalmente ajustados
A 10 de Setembro de 1772, Lavoisier escreveu no seu livro de anotações laboratoriais que se propunha investigar qual do fósforo absorvia ar quando era consumido pelo fogo. A 20 de Outubro apresenta um relatório à academia, de que na realidade o que foi referido anteriormente era de facto um caso, no qual a combustão do fósforo na presença de ar produzia um ácido fosfórico ( que ele denominou por espírito ácido de fósforo ), e que a absorção do ar era quem aparentemente causava a acidez. Realizou a mesma experiência, mas agora com enxofre e obteve resultados semelhantes. Estas experiências com enxofre e fósforo têm uma notável concordância com experiências de calcinação efectuadas por Guyton de Morveau. Com o objectivo de ver que ar era absorvido na calcinação, Lavoisier reduziu o litargírio com carvão e observou que no momento em que o resíduo de metal muda para o metal propriamente dito, uma quantidade de ar era libertada. Manifestamente, o ar também era fixado no resíduo metálico. Lavoisier começou a suspeitar que a absorção do ar na calcinação e combustão poderia ser explicada pela teoria de Turgot, mas a identificação de diferentes tipos de ar a partir das propriedades químicas é complicada e viria a ser a sua maior tarefa. Uma vez que já conhecemos a resposta, agora a solução para se resolver o puzzle da combustão e calcinação parece ser evidente. De momento já sabemos que o fósforo e o chumbo aumentam de peso porque combinam-se com o oxigénio no ar. Na redução do resíduo metálico com carvão, o carbono contido no carvão combina-se com o oxigénio do resíduo originando o dióxido de carbono ( ar fixo ) o qual é libertado durante a reacção deixando para trás o metal. O gás que combina com o metal na calcinação ( oxigénio ) não é o mesmo gás que é libertado na redução do resíduo metálico ( dióxido de carbono ). Esta explicação exige que, haverá diferentes tipos de ar e que o ar atmosférico será uma mistura destes diferentes tipos. O facto de que diferentes gases eram absorvidos e libertados na calcinação e redução tornava difícil descobrir o papel do ar na combustão e calcinação. Quando Lavoisier reduziu o resíduo metálico ( cal de chumbo ) com carvão, estava satisfeito por ter recolhido largas quantidades de ar, mas era um ar fixo. Este era suposto ser o ar que era absorvido da atmosfera quando o metal era calcinado, porque era o ar libertado na redução do resíduo metálico, mas a calcinação não tinha lugar numa atmosfera de ar fixo. Por esse motivo dificilmente conseguirá ter um ar fixo que conduz à sua absorção.
Em resumo do que aqui foi escrito temos que :
Segundo a teoria do flogisto chumbo = cal de chumbo + flogisto cal de chumbo + carvão(fonte de flogisto) = chumbo
Segundo Lavoisier chumbo + ar comum = cal de chumbo + calórico cal de chumbo + carvão = chumbo + ar fixo*
A interpretação moderna 2Pb + O2 = 2PbO 2PbO + C = 2Pb + CO2
SEGUNDO PRINCÍPIO
O segundo princípio da termodinâmica deve-se a Carnot - 1824, ( ver anexo 6 ), só que este esteve esquecido até 1848 altura em que Lord Kelvin chamou a atenção para o mundo cientifico da sua importância . As duas grandes ideias que Carnot introduziu foram : - a de ciclo de operações ( ciclo fechado) - a de ciclo reversível. O funcionamento de uma máquina térmica exige que se considere um ciclo fechado visto ser necessário imaginar uma série de operações tais que, no final de cada série, o vapor ou a água tenham regressado ao seu estado inicial, só aí se poderá falar da relação existente entre trabalho produzido e calor gasto nessa produção. ( ver anexo 7 ) A noção de ciclo reversível é muito importante na medida em que pode levar a que uma máquina térmica funcione ao contrário, ou seja, em vez de consumir calor na produção de trabalho, bombeie calor da fonte fria para a caldeira dando-se uma inversão na ordem das operações. Podemos então afirmar que a contribuição de Carnot e que traduz o segundo princípio da termodinâmica é que uma máquina cujo motor é o calor não pode produzir trabalho sem o emprego de duas fontes de calor a temperaturas diferentes. ( ver anexo 10 ) Vemos assim o retornar à ideia de relacionar trabalho e calor em termos práticos, isto não admira, pois Carnot estava disposto em aperfeiçoar as máquinas a vapor que estavam a colocar a Inglaterra à frente, economicamente falando, da França. Convém depois disto fazer um reparo, embora Carnot tenha sido de extrema importância no desenvolvimento da teoria do calor, é certo que também ele ainda aceitava o calórico e todo o posterior desenvolvimento foi baseado no conceito de estado.

TEMPERATURA ABSOLUTA
Deve-se a Lord Kelvin a introdução do conceito temperatura absoluta, sendo definida T = t + 273 , em que t é a temperatura centígrada. ( ver anexo 1 ) Em 1954 esta grandeza foi adoptada pela conferência geral dos pesos e medidas como unidade de temperatura a qual se passou a chamar grau Kelvin , actualmente esta designação está absoleta, designando-se simplesmente por Kelvin.

ENTROPIA ( TERCEIRO PRINCÍPIO )
As ideias trazidas por Carnot e Lord Kelvin motivaram um grande físico - Clausius, que veio como que abrir novos horizontes para o mundo cientifico, nomeadamente na ciência do calor, com a introdução de um novo conceito - Entropia. Com esta definição Clausius demonstrou que numa transformação reversivel a entropia é constante, visto a variação de calor ser nula e infere uma dedução ao segundo princípio de Carnot em que mostra que num sistema isolado as transformações irreversíveis provocam sempre um aumento de entropia, ou seja, numa transformação irreversível o sistema absorve uma certa quantidade de calor. Com todo este desenvolvimento ainda sobrou algum espaço imaginativo para demonstrar que no zero absoluto da temperatura, a entropia tem um valor mínimo o que fez com que Nernst em 1906 estabelecesse o terceiro princípio da termodinâmica em que define que no zero absoluto das temperaturas a entropia dos sistemas condensados é zero. Assim e porque este já era o valor mínimo para a entropia estabeleceu-se que num sistema isolado S=0
TRANSMISSÃO DE CALOR
Uma característica que ainda não foi focada nesta ciência do calor, é a sua transmissão. Os processos talvez mais importantes e que aqui vão ser abordados são: - condutibilidade - radiação
CONDUTIBILIDADE TÉRMICA Este processo começou a ser estudado em 1812 por Fourier mas só em 1822 se sabia alguma coisa a este respeito, visto ter só sido nesta altura que publicou os seus trabalhos. Dado que Fourier não tinha conhecimentos dos movimentos das moléculas responsáveis pelo calor, este partiu da hipótese que uma molécula aquece porque ela absorveu uma certa quantidade de calor, podendo ela própria também irradiar à sua volta certas quantidades de calor. A construção da sua teoria para além desta hipótese teve como base mais duas muito importantes: - a quantidade de calor cedida por uma molécula a outra durante um intervalo de tempo é proporcional a esse tempo, à diferença de temperatura entre as duas moléculas e é função da distância entre essas moléculas. ( q = T.f (r).dt )
CALOR RADIANTE Desde muito cedo que o homem se apercebeu que o calor se podia transmitir sem o auxilio de qualquer meio material, mas só em 1804, Rumford provou isto, ao mostrar que o calor se transmite no vácuo. Para isto, colocou no centro de um balão um termómetro, fez o vazio dentro do balão e mantendo-o fechado, colocou-o em água quente verificando que o termómetro mostrava uma subida de temperatura. Mesmo assim, a hipótese do calórico não foi totalmente abandonada, sendo-o só com o aparecimento do primeiro princípio da termodinâmica, como já se viu. A partir daqui várias experiências foram feitas, mas as dificuldades eram muitas dadas as perturbações existentes no fenómeno que se queria estudar. Estas dificuldades reduziram-se com o aparecimento de aparelhos que mediam a quantidade de calor absorvido, mas só por radiação. Um primeiro aparelho a aparecer foi o "par termoeléctrico" descoberto por Seebeck-1822. Com a ajuda destes pares termoeléctricos, Kirchoff-1882 estabeleceu uma lei já por ele falada em 1859 : - A razão entre o poder emissivo e o poder absorvente é a mesma para todos os corpos à mesma temperatura. Também ele no mesmo ano chegou ao conceito de corpo negro, conceito este que veio permitir progressos científicos que não se conseguiram com a utilização de corpos reais. Em 1879 - Stefan - descobre que a energia total irradiada pelo corpo negro é proporcional à quarta potência da temperatura absoluta.
CONCLUSÃO
Como se viu, até ao século XIX a teoria do calórico dominou o panorama da física térmica. Apesar da sua simplicidade trouxe conclusões quantitativas importantes como por exemplo : - o cálculo da quantidade entre calores específicos a pressão e a volume constantes. Permitiu também a Carnot a dedução do seu teorema, base da segunda lei da termodinâmica. Com este resultado obtido por Carnot, permitiu-se que Lord Kelvin estabelecesse a escala de temperaturas absolutas e a Nernst o terceiro princípio da termodinâmica . No século XIX e mais concretamente em 1842, através das intuições e cálculos de Mayer e Joule chegou-se à ideia de que o calor é uma forma de energia e que se poderá associar a trabalho. Estabeleceu-se assim o primeiro princípio da termodinâmica e a fundamentação definitiva da termodinâmica como ciência. Este conceito mecânico de calor motivou o desenvolvimento das teorias mecanicistas, dando origem à teoria cinética dos gases e da mecânica estatística. Esta por ser um bocado fastidiosa e também por fugir um pouco ao tema do trabalho - aspectos iniciais da ciência do calor, optou-se por omitir alguns aspectos relacionados a este tópico, não querendo com isto dizer que eles não tivessem sido importantes para a ciência do calor em termodinâmica. Por último, será oportuno referir que praticamente a par do surgimento do conceito de calórico já se tinha dado o nascimento de uma outra teoria - a do flogístico. Tudo começou com as experiências de Turgot baseada na dilatação de substâncias no estado de vapor, passando por Priestley o qual com a obtenção do ar fixo permitiu à teoria do flogisto uma melhor compreensão do fenómeno da combustão. Através de Boyle e da sua bomba pneumática foi possível começar-se a perceber a acção do ar como princípio vital da combustão. A introdução do conceito de flogisto deve-se a Stahl, com a ajuda de Becher que viria a descobrir diferentes tipos de terra os quais continham a terra gordurosa que era libertada durante a combustão. Sendo o carvão um composto rico em flogisto tinha-se que segundo a teoria flogistica era possível através dos resíduos metálicos na presença de carvão fornecendo calor a obtenção do estado metálico inicial. Uma conclusão tornou-se evidente : todos os compostos metálicos continham flogisto. Lavoisier também se interessou pelos problemas relacionados com a combustão, vindo a chegar às mesmas conclusões teóricas de Turgot, realizando posteriormente experiências de calcinação. Verificou que aquando da combustão na presença de ar se obtinha o ácido fosfórico e procurou saber que tipo de ar era absorvido durante a calcinação. Através das suas experiências pode-se concluir segundo a sua versão que, enquanto na calcinação o gás que entrava na reacção era o oxigénio, na redução libertava-se um outro gás, o dióxido de carbono. Daqui importa realçar que não ocorre reacção de calcinação estando nós na presença de uma atmosfera de ar fixo ( portanto com dióxido de carbono ) o que veio a ser decisivo para uma correcta interpretação do papel do ar na combustão e também na calcinação.

11/19/2008

biodiesel

Quim. Nova, Vol. 28, No. 1, 19-23, 2005
Artigo
*e-mail: ferrarir@uepg.br
BIODIESEL DE SOJA – TAXA DE CONVERSÃO EM ÉSTERES ETÍLICOS, CARACTERIZAÇÃO FÍSICOQUÍMICA
E CONSUMO EM GERADOR DE ENERGIA
Roseli Aparecida Ferrari*, Vanessa da Silva Oliveira e Ardalla Scabio
Departamento de Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual de Ponta Grossa, Av. General Carlos Cavalcante, 4748,
84030-900 Ponta Grossa - PR
Recebido em 17/10/03; aceito em 26/8/04; publicado na web em 23/11/04
BIODIESEL FROM SOYBEAN: CHARACTERIZATION AND CONSUMPTION IN AN ENERGY GENERATOR. Biodiesel
was produced by the transesterification of neutral soybean oil and anhydrous ethanol using NaOH as catalyst. Combinations of
biodiesel and diesel in the proportions of 0, 5, 10, 20, 40, 60, 80 and 100% were tested, respectively, as fuel in an energy generator.
The average consumption and mixture performance were analysed. The tests showed a reduction in Diesel oil consumption when
mixed with up to 20% of biodiesel. The quality characteristics of these fuels were analyzed.
Keywords: biodiesel; ethyl esters; transesterification.
INTRODUÇÃO
A maior parte de toda a energia consumida no mundo provém do
petróleo, do carvão e do gás natural. Essas fontes são limitadas e
com previsão de esgotamento no futuro, portanto, a busca por fontes
alternativas de energia é de suma importância1. Neste contexto, os
óleos vegetais aparecem como uma alternativa para substituição ao
óleo diesel em motores de ignição por compressão2-4, sendo o seu
uso testado já em fins do século XIX, produzindo resultados
satisfatórios no próprio motor diesel5,6. Esta possibilidade de emprego
de combustíveis de origem agrícola em motores do ciclo diesel é
bastante atrativa tendo em vista o aspecto ambiental, por serem uma
fonte renovável de energia5,7,8 e pelo fato do seu desenvolvimento
permitir a redução da dependência de importação de petróleo7.
Foi constatado, porém, que a aplicação direta dos óleos vegetais
nos motores é limitada por algumas propriedades físicas dos mesmos2,
principalmente sua alta viscosidade, sua baixa volatilidade e
seu caráter poliinsaturado, que implicam em alguns problemas nos
motores, bem como em uma combustão incompleta2,9-11. Assim, visando
reduzir a viscosidade dos óleos vegetais, diferentes alternativas
têm sido consideradas, tais como diluição, microemulsão com
metanol ou etanol, craqueamento catalítico e reação de transesterificação
com etanol ou metanol2,5. Entre essas alternativas, a transesterificação
tem se apresentado como a melhor opção2,12, visto que
o processo é relativamente simples1 promovendo a obtenção de um
combustível, denominado biodiesel, cujas propriedades são similares
às do óleo diesel3,8,9,13.
O biodiesel pode então ser definido como sendo um mono-alquil
éster de ácidos graxos derivado de fontes renováveis, como óleos
vegetais e gorduras animais4,14,15, obtido através de um processo de
transesterificação, no qual ocorre a transformação de triglicerídeos
em moléculas menores de ésteres de ácidos graxos9,12 . Encontra-se
registrado na “Environment Protection Agency – EPA – USA” como
combustível e como aditivo para combustíveis e pode ser usado puro
a 100% (B100), em mistura com o diesel de petróleo (B20), ou numa
proporção baixa como aditivo de 1 a 5%16; sua utilização está associada
à substituição de combustíveis fósseis em motores do ciclo diesel6,17,
sem haver a necessidade de nenhuma modificação no motor18.
Como combustível o biodiesel possui algumas características que
representam vantagem sobre os combustíveis derivados do petróleo,
tais como, virtualmente livre de enxofre e de compostos aromáticos;
alto número de cetano; teor médio de oxigênio; maior ponto de fulgor;
menor emissão de partículas, HC, CO e CO2; caráter não tóxico
e biodegradável, além de ser proveniente de fontes renováveis17,19,20.
A utilização de biodiesel como combustível vem apresentando
um potencial promissor no mundo inteiro21, sendo um mercado que
cresce aceleradamente22 devido, em primeiro lugar, a sua enorme
contribuição ao meio ambiente, com a redução qualitativa e quantitativa
dos níveis de poluição ambiental, principalmente nos grandes
centros urbanos23. Em segundo lugar, como fonte estratégica de energia
renovável em substituição ao óleo diesel e outros derivados do
petróleo. Assim, países como França, Áustria, Alemanha, Bélgica,
Reino Unido, Itália, Holanda, Finlândia, Estados Unidos, Japão e
Suécia vêm investindo significativamente na produção e viabilização
comercial do biodiesel, através de unidades de produção com diferentes
capacidades6,13,21 e também se pode dizer que para o Brasil
esta é uma tecnologia bastante adequada, devido à disponibilidade
de óleo de soja e de álcool etílico derivado da cana-de-açúcar. No
entanto, a comercialização do biodiesel ainda apresenta alguns gargalos
tecnológicos24, surgindo como obstáculos para sua comercialização
o preço da matéria-prima e os custos operacionais25.
O Brasil consome cerca de 35 milhões de t/ano de óleo diesel26,
assim, com ampliação deste mercado a economia de petróleo importado
seria expressiva, podendo inclusive minimizar o déficit de nossa
balança de pagamentos. Além disso, no processo de transesterificação
resulta como subproduto a glicerina1,2,9, sendo seu aproveitamento
outro aspecto importante na viabilização do processo de
produção do biodiesel, fazendo com que ele se torne competitivo no
mercado de combustíveis27.
A maior parte do biodiesel atualmente produzido no mundo deriva
do óleo de soja, utilizando metanol e catalisador alcalino4, porém,
todos os óleos vegetais, enquadrados na categoria de óleos fixos
ou triglicerídeos, podem ser transformados em biodiesel28.
Fatores como a geografia, o clima e a economia determinam o
óleo vegetal de maior interesse para uso potencial nos biocombustíveis.
Assim, nos Estados Unidos, por exemplo, o óleo de soja é
considerado como matéria-prima primordial e, nos países tropicais,
é o óleo de palma. Dentre as matérias-primas incluem-se os óleos de
20 Ferrari et al. Quim. Nova
palma, soja, algodão e mamona, além dos óleos de menor produção
como o de babaçu6. Na Alemanha, o óleo de colza é utilizado na
produção de biodiesel, o qual é distribuído de forma pura, isento de
qualquer mistura ou aditivação. Há também a produção de biodiesel
na Malásia a partir do óleo de palma29.
Os óleos vegetais mais comuns, cuja matéria prima é abundante
no Brasil, são soja, milho, amendoim, algodão, babaçu e palma30. A
soja, considerada a rainha das leguminosas, dispõe de uma oferta
muito grande do óleo, pois quase 90% da produção de óleo no Brasil
provêm dessa leguminosa28. A produção mundial de soja da safra
00/01 situou-se em 174,3 milhões de t, patamar 9,0% maior que da
safra 99/00 (159,85 milhões)31 A produção brasileira de soja na safra
de 2002 foi de aproximadamente 43 milhões de t32.
Quanto aos álcoois, os mais freqüentemente empregados são os
de cadeia curta, tais como metanol, etanol, propanol e butanol. No
Brasil o uso de etanol anidro é vantajoso, pois este é produzido em
larga escala para ser misturado à gasolina1, além de ser um produto
obtido através de biomassa e, dessa maneira, o processo torna-se
totalmente independente do petróleo5, promovendo a produção de
um combustível completamente agrícola9. A produção de etanol está
prosperando e já alcançou 7 bilhões de litros por ano, sendo que a
capacidade instalada de produção no Brasil é da ordem de 16 bilhões
de L/ano. Segundo Lima33, a produção nacional de álcool anidro no
período de 97/98 esteve em torno de 5.596.000 m3.
Com relação aos catalisadores, a transesterificação pode ser realizada
tanto em meio ácido quanto em meio básico34 porém, ela
ocorre de maneira mais rápida na presença de um catalisador alcalino
que na presença da mesma quantidade de catalisador ácido,
observando-se maior rendimento e seletividade, além de apresentar
menores problemas relacionados à corrosão dos equipamentos9,35.
Os catalisadores mais eficientes para esse propósito são KOH
e NaOH, sendo que o uso de hidróxido de sódio, ao invés de
metóxido de sódio, é preferido por causa dos perigos e inconvenientes
do uso de metal de sódio36.
Para aumentar o rendimento de alquil ésteres e para permitir a
formação de uma fase separada de glicerol um excesso de agente
transesterificante (álcool primário) é usado, devido ao caráter reversível
da reação1,35. Também, para que resulte uma transesterificação
satisfatória, os óleos devem possuir baixo teor de ácidos graxos livres37,38,
pois esses durante o processo de transesterificação podem
reagir com o catalisador alcalino formando produtos saponificados39,
o que diminui a eficiência de conversão. Os óleos brutos comercialmente
encontrados possuem um índice de acidez entre 0,5 – 3%39,
sendo indicado para uma reação completa na produção de biodiesel
que o teor de ácidos graxos livres seja inferior a 3%37.
Inúmeros trabalhos vêem sendo desenvolvidos com testes de
vários tipos de óleos transesterificados, puros ou misturados ao diesel
convencional em diferentes proporções e têm demonstrado bons
resultados quando utilizados por caminhões, ônibus e tratores8,17,27,40.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a taxa de conversão
do óleo neutro de soja em éster etílico (biodiesel) e o rendimento no
processo de transesterificação, bem como caracterizá-lo segundo
parâmetros químicos e físicos, testando seu consumo em gerador de
energia elétrica.
PARTE EXPERIMENTAL
Obtenção dos ésteres etílicos
A reação de transesterificação foi realizada em um reator de 5 L,
provido de camisa de circulação de água aquecida e agitação mecânica.
O sistema permaneceu a 50 ºC e então 3 L de óleo neutro de
soja foram adicionados. Quando o sistema atingiu 45 ºC, a solução
de 1,5 L de etanol anidro e 15 g do catalisador NaOH foi adicionada,
estabelecendo-se este momento como sendo o tempo zero da reação.
O tempo de reação foi 5 min, pois neste tempo foi constatada a conversão
completa de ésteres pelo escurecimento brusco da mistura,
seguida de retorno da coloração inicial da mistura. Após o término
da reação, 600 g de glicerina p.a foi adicionada para acelerar a formação
da fase inferior. Isso resultou na formação de uma fase superior
correspondente aos ésteres etílicos e uma fase inferior contendo
a glicerina, formada pela reação e adicionada, ao excesso de etanol,
o hidróxido de sódio que não reagiu, junto com os sabões formados
durante a reação e alguns traços de ésteres etílicos e glicerídeos parciais.
Após a separação das duas fases por decantação, os ésteres obtidos
foram purificados através da lavagem com uma solução contendo
1,5 L de água destilada a 90 ºC e 0,5% de HCl concentrado. Com
isso o catalisador remanescente da reação foi neutralizado, fato confirmado
com a análise da água de lavagem com indicador fenolftaleína
1%. A fase aquosa foi separada do éster por decantação e os traços
de umidade foram eliminados pela filtração posterior com sulfato de
sódio anidro. A fase inferior separada foi submetida a uma destilação
a 80 ºC sob vácuo moderado, para recuperação do excesso de
etanol, e a glicerina permaneceu.
Conversão em ésteres etílicos
O biodiesel obtido foi analisado qualitativamente através de
cromatográfica em camada delgada – CCD, para se verificar a conversão
em ésteres etílicos. Para isso, o biodiesel foi dissolvido em
éter de petróleo e aplicado em uma placa cromatográfica contendo
sílica como fase estacionária. Os padrões empregados foram ésteres
de ácidos graxos, ácidos graxos e triglicerídeos, também dissolvidos
em éter de petróleo. A fase móvel utilizada na cuba cromatográfica
foi uma mistura de éter de petróleo, éter etílico e ácido acético na
proporção de 80:20:1, respectivamente. A placa cromatográfica após
eluição foi revelada com vapor de iodo e o Rf das manchas dos padrões
e dos componentes das amostras foi determinado.
A conversão da reação de transesterificação foi determinada com
base na quantidade de óleo neutro de soja que entra no processo.
Após o preparo de diversas bateladas obteve-se, então, uma conversão
média na formação de ésteres etílicos.
Caracterização quanto aos aspectos químicos e físicos
As análises químicas e físicas foram conduzidas, respectivamente,
pelas seguintes metodologias: quanto aos parâmetros de cor, aspecto,
massa específica a 20 °C, teor de enxofre, índice de cetano, resíduo
de carbono e miscibilidade em óleo diesel segundo metodologias
recomendadas pela ANP (Agência Nacional do Petróleo)41; índice
de iodo, método Cd 1-25 AOCS42, índice de acidez, método Ca 5-40
AOCS42, índice de peróxido, método Cd 3-25 AOCS42 e teor de cinzas,
método Ca 11-5542.
Caracterização quanto à composição em ésteres etílicos de
ácidos graxos
A composição em ésteres de ácidos graxos foi determinada por
cromatografia gasosa após preparo dos ésteres segundo método descrito
por Hartman e Lago43. O cromatógrafo utilizado foi Perkin Elmer
Sigma 3B, equipado com detector FID e coluna 10% DEGS. As
temperaturas do injetor e do detector foram mantidas a 225 °C e a da
coluna a 175 °C. A identificação dos picos foi realizada através da
comparação com tempo de retenção de padrões Nu-Chek, e a
quantificação por normalização de área.
Vol. 28, No. 1 Biodiesel de Soja 21
Teste de consumo em gerador de energia
Os testes de consumo foram realizados em um gerador de energia
de Marca Yanmar do Brasil S.A/ NSB50 – Kohlbach S.A/ Rot. 1800/
Hz 60, mantido sob as mesmas condições de operação. O diesel puro
e de misturas deste com 5, 10, 20, 40, 60 e 80% de biodiesel, bem
como o do biodiesel puro foram aplicados numa quantidade
estabelecida ao gerador de energia e o tempo de consumo dos mesmos
foi monitorado. O consumo médio foi então determinado e expresso
em L/h de funcionamento do equipamento.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A taxa de conversão do óleo neutro de soja em ésteres etílicos
depende diretamente da maneira que a reação de transesterificação é
conduzida, bem como das condições do processo. Assim, o curso da
transesterificação (Figura 1) é influenciado por vários fatores que incluem
o tipo de catalisador (alcalino ou ácido), razão molar álcool/
óleo vegetal, temperatura, pureza dos reagentes (principalmente o conteúdo
de água) e o teor de ácidos graxos livres, os quais têm influência
no curso da transesterificação1. Neste trabalho, o processo de catálise
básica foi adotado tendo em vista o fato de apresentar melhor rendimento
e seletividade, além de menor tempo de reação que a catálise
ácida9,35 e, também, para evitar problemas com corrosão dos componentes
do motor, que ocorrem devido à presença de traços de ácido10.
O álcool utilizado foi o etanol isento de água (anidro) e em excesso
devido ao caráter reversível da reação de transesterificação1,34,35. Assim,
por causa deste equilíbrio reacional, um excesso de álcool aumenta
a conversão de éster pela mudança deste equilíbrio para direita.
Quanto ao tempo reacional, como indicam algumas pesquisas, a
reação de transesterificação é muito rápida, pois a conversão de ésteres
etílicos é próxima do valor máximo com apenas 5-10 min de reação,
estabiliza no valor máximo após 20-30 min e alguns autores indicam
que no equilíbrio existem di- e monoglicerídeos com concentração de
2 e 4%, respectivamente9. No período inicial a reação é muito rápida,
existindo um segundo período muito mais longo que o primeiro, no
qual a composição evolui vagarosamente até o equilíbrio44. Neste trabalho,
após o acompanhamento cromatográfico dos produtos formados
após diversos períodos de tempo de reação, o tempo de 5 min foi
estabelecido como suficiente para a ocorrência da conversão do óleo
neutro e seco em éster. O fato do óleo não apresentar ácidos graxos
livres e ser isento de umidade favoreceu a formação rápida dos ésteres
etílicos. Além disso, observou-se que no momento da ocorrência da
reação há uma brusca mudança na cor da mistura, sendo esta escurecida
e logo após retornando à coloração inicial.
Normalmente a alcoólise alcalina de óleos vegetais é conduzida
a temperatura próxima do ponto de ebulição do álcool e a temperatura
está correlacionada com o tempo de reação. Porém, alguns autores
afirmam que temperatura de reação acima de 60 ºC deve ser evitada,
pois esta tende a acelerar a saponificação dos glicerídeos pelo
catalisador alcalino antes da completa alcoólise9 e que a transesterificação
pode ser realizada satisfatoriamente à temperatura ambiente44.
Logo, a temperatura de aproximadamente 45 ºC foi adotada de
modo a se obter uma conversão satisfatória de ésteres etílicos, não
ultrapassando a temperatura do ponto de ebulição do etanol.
É importante também atentar para a necessidade de se remover
as impurezas que permanecem na fase éster, por exemplo, sabões,
traços de NaOH, traços de etanol e glicerol livre. Caso contrário, um
alto teor de glicerol livre pode resultar na separação do glicerol, causando
problemas durante o armazenamento, no sistema do combustível
ou alta produção de aldeídos. Para tanto, a fase éster foi submetida
à lavagem com água destilada acidificada com HCl concentrado,
a 90 ºC. A eficiência da lavagem foi indicada por um teste com
indicador de pH. Então, utilizando-se uma solução de fenolftaleína
1% pode-se observar se o pH do éster está neutro pela análise da
água de lavagem que sai do reator, ou seja, quando testada não apresenta
variação de coloração. Além disso, observando-se a baixa presença
de glicerol livre no éster obtido, como indicado na Tabela 3,
pode-se dizer que o glicerol foi removido com sucesso, o que indica
que a etapa de purificação foi adequada.
Analisando-se os cromatogramas obtidos, verificou-se através
dos Rfs das manchas obtidas, conforme a Tabela 1, a produção apenas
de ésteres etílicos, confirmando a eficiência da conversão total
dos ácidos graxos em ésteres etílicos pelo procedimento adotado neste
trabalho. Considera-se que a CCD é uma técnica bastante simples
que pode ser utilizada de forma qualitativa, mas bastante eficiente,
para avaliar se a conversão em ésteres etílicos foi completa e, conseqüentemente,
houve a produção de biodiesel.
Através do balanço de massa do processo, obtém-se como resultado
da reação de transesterificação 57,26% em ésteres etílicos,
22,29% em glicerina, 10,04% de etanol recuperado e 10,41% de
perdas, em massa, como pode ser verificado na Tabela 2. Vale dizer
que estes valores representam o rendimento médio de 13 bateladas
consecutivas.
Reduções nas perdas existentes neste tipo de processo poderão
baixar os custos de produção. A recuperação de parte do etanol foi
possível, pois este foi adicionado em excesso no início da reação,
devido ao caráter reversível da transesterificação. Visando a redução
de custos, testou-se o retorno desse etanol ao processo. Com esse
procedimento observou-se a conversão do óleo de soja em biodiesel,
porém esta não foi completa, acarretando uma diminuição no rendimento.
Isto pode ser explicado pelo fato do etanol recuperado não
possuir caráter anidro, assim sendo, antes de retornar ao processo
deveria ser desidratado.
Ainda vale salientar que partindo apenas da quantidade de óleo
que entra na reação observa-se uma taxa de conversão de 97,5% dos
Tabela 1. Rfs de padrões e de amostra de biodiesel obtido a partir de
óleo neutro de soja e de óleo de soja usado em fritura
Composto Rf
Triglicerídeos 0,54
Ácidos graxos 0,44
Ésteres de ácidos graxos 0,71
Biodiesel óleo neutro de soja 0,70
Figura 1. Transesterificação de triglicerídeos, onde R1, R2 e R3 representam
as cadeias carbônicas dos ácidos graxos
Tabela 2. Rendimento médio das 13 bateladas do processo de
obtenção do biodiesel
Produto Rendimento do processo %
Biodiesel (ésteres etílicos) 57,26±3,65
Glicerina 22,29±2,24
Etanol 10,04±2,99
Perdas 10,41±2,82
22 Ferrari et al. Quim. Nova
ácidos graxos presentes em ésteres etílicos, com produção de glicerina
como subproduto.
A glicerina é um produto de valor comercial e que possui inúmeras
aplicações industriais, porém a glicerina obtida no processo de
produção do biodiesel apresenta-se mais escura e contendo algumas
impurezas. Sendo assim, há um grande interesse na sua purificação e
no seu reaproveitamento, o que já vem sendo estudado45, pois isto
levaria à viabilização do processo, permitindo que o biodiesel se
torne competitivo no mercado de combustíveis.
As características de qualidade do produto obtido são relatadas
na Tabela 3, onde os parâmetros foram comparados com a
especificação da ANP para o diesel comercializado no país41. O número
de cetano representa uma das mais importantes propriedades
do diesel automotivo e seu aumento geralmente resulta em redução
da emissão pela exaustão, diminuindo o consumo de combustível e
reduzindo o barulho do motor44. Como equações para predizer o
número de cetano não são aplicáveis ao biodiesel, um parâmetro
alternativo adotado para o biodiesel é o índice de cetano13 e o valor
obtido para o éster etílico produzido foi maior que aquele derivado
do óleo diesel, reiterando a adequação de suas características como
combustível automotivo alternativo. Observa-se também que o teor
de enxofre total presente no biodiesel é inferior ao do óleo diesel, o
que confere ao biodiesel uma grande vantagem, pois elimina a emissão
de gases de enxofre (SO2 por exemplo) que ocorre no escape dos
motores a diesel. Após esta avaliação pode-se observar que os
parâmetros de qualidade do produto estão compatíveis com as
especificações existentes atualmente para o diesel. Assim, pode-se
dizer ainda que a similaridade encontrada nos pesos moleculares entre
os ésteres obtidos e o diesel comercial estende-se às propriedades
físico-químicas, o que incentiva o teste dos ésteres graxos como
melhor sucedâneo do diesel que os óleos vegetais in natura2.
Quanto ao resíduo de carbono, que representa a tendência de
formar carbono dos combustíveis13, pode-se dizer que este é um
parâmetro de grande importância na análise de combustíveis, pois
há uma correlação entre o conteúdo de carbono do combustível e a
formação de depósitos no injetor46. Como se pode observar no caso
dos ésteres etílicos de óleo de soja, um valor inferior ao das especificações
do diesel combustível foi encontrado para o resíduo de
carbono, embora este valor exceda ao especificado para o biodiesel
de acordo com a E-DIN 51606. No entanto, não foi relatado nenhum
problema quanto à combustão incompleta ou depósito anormal de
carbono durante os testes.
A composição média de ésteres etílicos de ácidos graxos do
biodiesel produzido pode ser verificada na Tabela 4. Observa-se a predominância
de ésteres etílicos de ácidos graxos insaturados, com o
ácido linoleico aparecendo em maior quantidade, e um teor total de
14,83% de ésteres etílicos de ácidos graxos saturados presentes no
biodiesel produzido a partir do óleo neutro de soja. Dependendo da
matéria-prima, o biodiesel pode conter mais ou menos ácidos graxos
insaturados em sua composição, os quais são susceptíveis a reações de
oxidação aceleradas pela exposição ao oxigênio e altas temperaturas,
condições que são pertinentes ao funcionamento do motor. A decomposição
térmica também pode resultar em compostos poliméricos, que
são prejudiciais ao funcionamento do motor. Portanto, há a necessidade
de se determinar a composição em ésteres de ácidos graxos no
biodiesel para poder se estudar sua estabilidade47.
O consumo em litros por hora de diesel e de suas misturas com
biodiesel, nos testes utilizando gerador de energia após várias repetições,
é apresentado na Tabela 5, sendo seu perfil de consumo demonstrado
pelo gráfico da Figura 2.
Os resultados demonstraram que com a adição de até 20% de
biodiesel ocorreu uma diminuição do consumo do combustível pelo
equipamento contudo, quando o teor de biodiesel na mistura com o
diesel foi mantido acima de 20% ocorreu uma elevação no consumo
do combustível utilizado. Monyem e Van Gespen14 também observaram
que a performance do motor com biodiesel puro e suas misturas
foi similar à observada com diesel combustível com a mesma eficiência
térmica, mas o consumo de combustível foi maior, devido
possivelmente a seu menor poder calorífico.
Agarwal e Das11 igualmente encontraram que 20% da mistura de
biodiesel no óleo diesel, testado em um motor a diesel, teve a melhor
performance entre todas as misturas analisadas, sendo que esta obteve
um benefício de 2,5% na máxima eficiência térmica e teve subs-
Tabela 5. Consumo em litros por hora de diesel, misturas de diesel
biodiesel e biodiesel testados em gerador de energia Yanmar
Combustível Consumo (L/h)
Diesel 0,6981
B5 0,6760
B10 0,6571
B20 0,6875
B40 0,7115
B60 0,7255
B80 0,7555
B100 0,7914
Tabela 4. Composição média de ésteres etílicos de ácidos graxos do
biodiesel de soja produzido
N° de Carbonos Ácido Graxo Concentração (%)
C16:0 Palmítico 11,29
C18:0 Esteárico 03,54
C18:1 Oléico 22,45
C18:2 Linoleico 54,62
C18:3 Linolênico 08,11
Tabela 3. Características de qualidade do biodiesel de soja obtido comparado com algumas especificações para o diesel comercializado no
Brasil segundo a Port. 310/01 da ANP41 e biodiesel de acordo com E-DIN 51606
Características Especificação diesel Especificação biodiesel Biodiesel de soja
Aspecto Límpido, isento de impurezas - Límpido, isento de impurezas
Cor ASTM, máx. 3,0 - 2,0
Enxofre Total, máx. 0,35% - <0,075%
Massa específica a 20 °C 820 a 880 kg/m3 875 a 900 kg/m3 877,5 kg/m3
Índice de cetano, mín. 45 - 57,8
Resíduo Carbono, máx. 0,25% <0,05% 0,14%
Índice de acidez - <0,5 mg KOH/g 0,5 mg KOH/g
Índice de Iodo - <115 g I2/100 g 104,45 g I2/100 g
Cinzas 0,02% - 0,006%
% de glicerol livre - <0,02 0,0109%
Vol. 28, No. 1 Biodiesel de Soja 23
tancial redução nos teores de fumaça. Já Dorado et al.8 concluíram
que o motor a diesel, analisado sem nenhuma modificação, funcionou
de maneira bem sucedida com misturas de 10% de biodiesel de
óleo de fritura e 90% de óleo diesel, sem nenhum dano aparente nos
componentes do motor. Al-Widyan et al.48 estudando o potencial do
biodiesel para substituição do óleo diesel obtiveram resultados que
indicaram que as diversas misturas éster/diesel estudadas queimaram
com maior eficiência e com menor consumo específico de combustível,
resultando, portanto, em maior eficiência térmica do motor.
Além disso, as misturas produziram menos monóxido de carbono
que o óleo diesel. O éster 100% e a mistura 75:25 éster/diesel teve a
melhor performance, enquanto que a mistura 50:50 consistentemente
resultou em menor emissão em todas as velocidades testadas.
CONCLUSÕES
O processo de obtenção de biodiesel a partir do óleo neutro de
soja adotado neste trabalho promove uma conversão de 97,5% do
óleo em ésteres etílicos, através de processo simples e rápido. As
perdas no processo foram de 10%, as quais sendo reduzidas, juntamente
com a recuperação de etanol e comercialização da glicerina
gerada, tornam o processo viável.
Quanto aos parâmetros químicos e físicos analisados pode-se
dizer que o biodiesel se apresenta com qualidade de acordo com os
limites estabelecidos pela ANP para o óleo diesel comercial e possui
predominância de ésteres etílicos de ácidos graxos insaturados em
sua composição. Quando testado em gerador de energia elétrica em
mistura com óleo diesel comercial numa proporção de até 20% de
biodiesel, apresentou uma diminuição do consumo do combustível.
Sendo o biodiesel obtido de fontes renováveis, matérias-primas
abundantes no Brasil, a geração de emprego que a obtenção em escala
industrial deste produto irá ocasionar, a redução da dependência
externa de importação de diesel consumido no país, aliada ao fato da
redução da poluição atmosférica com adição do biodiesel ao diesel,
e ainda a vantagem constatada neste trabalho da diminuição do consumo
de combustível quando o teor do mesmo na mistura está na
faixa de até 20%, nos estimula a recomendar esta adição.
AGRADECIMENTOS
Ao CNPq pelo apoio concedido e à empresa COINBRA pelo
óleo fornecido.
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